Ana Rosa, personagem de Mastigando Humanos. O Jacaré nutre por ela(e) e por seu Yakisoba, grande afeto.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Resenha do livro: Segredos Públicos: Os blogs de mulheres no Brasil; Luiza Lobo

Luiza Lobo é ensaísta, cronista, contista, poeta, tradutora e professora de graduação e de pós-graduação de Teoria Literária e Literatura Comparada do Departamento de Ciência da Literatura da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Entre sua vasta produção, tanto no campo da ficção quanto no que se refere à pesquisa científica, destacam-se os estudos voltados para a figura feminina, tanto em sua expressão na literatura quanto na Cultura. Tal recorte, presente em diversos ensaios, artigos e ficções da autora, levaram a Editora Rocco a lhe fazer um convite: a proposta seria analisar a relação entre o fenômeno dos blogs, ferramenta através da qual qualquer indivíduo pode publicar na Web, e a escritura, bem como a própria posição social da mulher na blogosfera.
Segredos Públicos: Os blogs de mulheres no Brasil é fruto da investigação de Lobo acerca das questões levantadas na observação e análise do comportamento feminino na blogosfera. O estudo lança mão do recorte da escrita feminina para uma profícua comparação dos blogs contemporâneos com os antigos diários íntimos escritos por mulheres.
O terreno em que Lobo instala sua análise é fértil por dois motivos: Primeiramente, por abordar um diferencial do contexto contemporâneo, que são as novíssimas mídias, o uso quase vital da internet, a quantidade de conteúdo e a velocidade em que se tem acesso à informação, a democratização do compartilhamento de arquivos e principalmente o hibridismo entre público e privado que se instala com o boom das páginas pessoais-interativas na web a partir do fim do século XX. Nestes termos, a análise estaria direcionada à abordagem não só de uma reconfiguração dos meios de expressão, mas também de uma noção de sujeito contemporâneo.
Seguramente, o segundo motivo está sujeito ao prisma de leitura que se dá ao estudo de Lobo, por ser este, como define a própria autora, de caráter literário, social, “com pé” na filosofia, ontologia e existencialismo. Em referência à proposta inicial do livro, no entanto, o segundo motivo da “fertilidade” da análise de Lobo seria justamente o lugar de fala feminino, sobre o qual a autora disserta, tanto no que diz respeito aos blogs quanto no que diz respeito à história, cultura e sociedade. A interface com as questões externas à teoria literária é inevitável no estudo que propõe Lobo, uma vez que as mudanças histórico-sociais-psicológicas por que passou a figuração feminina na sociedade ocidental funcionaram, no livro, como suporte de análise do sujeito que escrevia diários íntimos a partir da renascença e do sujeito que escreve blogs nos séculos XX e XXI.
Apesar de parecer fincar seu discurso num recorte específico – mulheres que escreviam diários íntimos nos séculos que, a partir do XVII, antecedem o XXI e o comportamento feminino na blogsfera – Segredos Públicos acaba sendo preenchido por generalizações, uma limitancia feminista por vezes exagerada e por diversas contradições da teoria literária que se apresentam no livro sobre os mesmos tópicos.
Lobo integra a concepção do cibespaço como um espaço democrático e plural, onde todo individuo que se identifique, ou não, tem seu espaço garantido. No caso da mulher, no entanto, Lobo lança a idéia do blog como um espaço de exposição de desejos íntimos e profundos ou de “contação de casos tipicamente femininos”, como se a mulher ao abandonasse as suas características e levantasse a bandeira destas, agora com mais liberdade, nos blogs. O equívoco desta concepção, que se pode perceber ao longo de todo o texto, pode estar justamente em generalizar o que é a essência feminina e fazer uso do histórico da mulher na sociedade machista como base para tal argumentação. A mulher de que fala Lobo conquistou espaço de fala nos blogs, mas esta fala está seriamente afetada por sentimentalismo, confissão e futilidade. Lobo busca na opressão social as fontes para uma mulher submissa e vitimada, que finalmente deixa seu diário sobre a cama e busca se expressar para o mundo. Parece que a autora não se preocupou em determinar que tipos de blogs ou que facetas expressas em blogs femininos iria priorizar, em como ligar estes blogs à uma determinada corrente do comportamento feminino. Esta não determinação está expressa nas generalizações de Lobo como por exemplo: “Para a mulher, não é que a política não exista como assunto, mas o mundo emocional é o mais importante para ela(...)Como veremos, esta é a contribuição da linguagem dos blogs femininos para a internet e para a sociedade em geral”(LOBO, 2007, P. 47). Em afirmações como esta e na própria expressão “a mulher” seguida de uma classificação geral ou “os blogs de mulheres” que também são classificados e adjetivados, o terreno “fértil” em que poderia se instalar a análise de Lobo em relação ao que se propõe como multidisciplinar no seu texto (a ãncora nas relações sociais, históricas e psicológicas da figuração feminina para que se faça ligação com sua atuação nos blogs) no seu texto, ganha um caráter superficial dando a impressão de que elementos demais foram trazidos para o texto e de que por serem muitos para um texto pequeno não foram analisados com devida atenção.